Estudo aponta elo entre saneamento deficiente e alta mortalidade infantil

Agência FAPESP

Com base em dados epidemiológicos e de condições de saneamento, estudo realizado por pesquisadores da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) reforça ainda mais a forte relação que existe entre saneamento básico e mortalidade infantil.

A pesquisa, desenvolvida por Júlio César Teixeira e Marcelo Pungirum, com dados de 44 países da América Latina, mostra que a situação, no geral, continua ruim.

De um lado, as más condições de saneamento básico de um país têm relação direta com as elevadas taxas de mortalidade infantil. Do outro, a universalização da infra-estrutura urbana, o combate à desnutrição infantil e a ampliação do aleitamento materno são medidas decisivas para que a correlação identificada possa ser alterada.

O trabalho, realizado com dados da Organização Pan-Americana de Saúde (Opas), foi publicado em dezembro na Revista Brasileira de Epidemiologia. A área geográfica estudada soma mais de 560 milhões de habitantes.

“Os países em desenvolvimento entram no terceiro milênio ressuscitando patologias do início do século 20”, ressalta o artigo. “Grande parte das doenças registradas nesses países decorre da falta de saneamento, como diarréias, cólera, dengue, hepatite A, leptospirose e esquistossomose.”

Uma das causas desse quadro seria o inchaço da periferia das cidades de grande e médio porte, o que gera aumento nos índices de favelização, desemprego e miséria. “Essas condições tendem a piorar devido às necessidades crescentes de serviços de saneamento ambiental, que excedem a capacidade dos governos de reagir adequadamente”, alertam os autores.

A principal conseqüência da falta de infra-estrutura sanitária desses países é a elevada taxa de mortalidade infantil, um dos indicadores mais utilizados para análise da situação de saúde de um país. “Se em Aruba a mortalidade infantil não foi superior a 1,5 por 1.000 nascidos vivos, no Haiti essa taxa é de 80,3 por 1.000”, compara o artigo. Apenas 26,4% da população do Haiti têm acesso a serviços de esgoto.

Em relação à mortalidade em menores de 5 anos de idade, em 2002 os países da América Latina e do Caribe apresentaram um coeficiente médio de 33,1 óbitos por 1.000 nascidos vivos. Esse valor é quatro vezes superior ao verificado nos Estados Unidos no mesmo período – de 8,4 crianças por 1.000 nascidos vivos.

A taxa de mortalidade infantil (TMI) é um dos indicadores mais utilizados para análise da situação de saúde de um país. Na mortalidade infantil, importante parcela de responsabilidade é atribuída aos serviços de saúde e de saneamento. Sabese que medidas sanitárias adequadas e serviços de saúde acessíveis e de boa qualidade podem atuar positivamente na redução da mortalidade infantil9.

Nas últimas décadas, apesar das condições de vida desfavoráveis, a mortalidade infantil tem apresentado Os resultados obtidos confirmaram a correlação inversamente proporcional existente entre a taxa de mortalidade infantil e a cobertura populacional por abastecimento de água. Leal & Szwarcwald analisando a evolução da mortalidade neonatal no estado do Rio de Janeiro, de 1979 a 1993, constataram que a sua redução era resultado, entre outros fatores, da ampliação da rede pública de abastecimento de água.

Nos países estudados, observou-se, ainda, que quanto menor a cobertura populacional por sistemas de esgotamento sanitário, maior a mortalidade infantil. O Haiti, por exemplo, apresentou a maior taxa de mortalidade infantil – 80,3 por mil nascidos vivos, como já visto anteriormente – e a menor proporção de população com acesso a serviços de esgotamento sanitário – 26,4%.

Tais resultados corroboram as afirmações de Kerr-Pontes & Rouquayrol12, que em comunidades onde não há esgoto coletado, nem água potável suficiente para as necessidades domésticas, encontram-se taxas de mortalidade infantil elevadas.

Segundo os pesquisadores há uma associação estatisticamente significativa entre a mortalidade em menores de cinco anos de idade e a proporção de população urbana, com coeficiente â negativo, ou seja, uma relação inversamente proporcional.

Os poucos estudos existentes analisando esta associação têm mostrado resultados discordantes. No entanto, Black, Morris & Bryce sustentam que: “embora a maior incidência de mortalidade entre menores de cinco anos esteja em áreas rurais, identifica-se altas taxas também em áreas urbanas. Como exemplo, pode-se citar as favelas de Nairóbi, no Quênia, que apresentam índices maiores do que as áreas rurais do mesmo país”. Portanto, sustenta-se que na América Latina e no Caribe, a urbanização crescente nem sempre está sendo acompanhada da implantação de infra-estrutura urbana necessária, o que tem elevado a mortalidade entre menores de cinco anos em áreas urbanas. Observou-se ainda uma relação estatisticamente significativamente – inversamente proporcional – entre a mortalidade em crianças menores de cinco anos de idade e a cobertura populacional por sistemas de esgotamento sanitário.

Quanto a esta associação, Teixeira afirma que, para áreas urbanas com precária infra-estrutura urbana, em relação à falta de esgotamento sanitário, há evidências de que o maior risco para a saúde infantil está associado, em primeiro lugar, à disposição de esgotos no terreno, no entorno da moradia, principalmente para a diarréia e as parasitoses associadas a geohelmintos; e, em segundo lugar, à presença de esgotos escoando na rua, principalmente para as parasitoses de transmissão feco-oral. Este conjunto de doenças contribui, segundo o autor, para o aumento da morbi-mortalidade em crianças menores de cinco anos de idade.

Futuramente materiais de pesquisa e íntegras de artigos só estarão disponíveis para os associados do CLUBE DE AMIGOS DA AGUAONLINE.

AGUARDE!!

Para ler a íntegra do artigo Análise da associação entre saneamento e saúde nos países da América Latina e do Caribe, empregando dados secundários do banco de dados da Organização Pan-Americana de Saúde, na biblioteca on-line SciELO (Bireme/FAPESP) acesse o arquivo abaixo.

Leite e água

A mortalidade por doenças diarréicas agudas em crianças menores de cinco anos de idade apresentou um valor médio de 7,1% do total de óbitos. Para este indicador, encontrou-se associação com o déficit nutricional moderado e grave nestas crianças. Tal achado está amplamente comprovado.

A título de exemplo, pode-se citar o caso da Guatemala. O país apresenta o maior índice de mortalidade por doenças diarréicas agudas em crianças menores de cinco anos de idade da América Latina e do Caribe (17,1%) e a segunda maior prevalência de déficit nutricional infantil na região (24,2%).

Este exemplo reforça a hipótese de que quanto maior a prevalência por desnutrição infantil em um determinado país, maior será o risco de mortalidade por doenças diarréicas agudas em crianças menores de cinco anos de idade.

Outro fator associado à mortalidade por doença diarréica aguda em menores de cinco anos de idade é o baixo percentual de crianças cobertas com aleitamento materno exclusivo até os 120 dias de idade.

Segundo Cunningham, Jelliffe & Jelliffe18, o aleitamento materno é uma fonte de alimento nutricionalmente mais adequada para o lactente e traz, também, uma proteção importante contra a diarréia, a desnutrição, as insuficiências respiratórias agudas e a meningite.

De acordo com recomendações da Organização Mundial da Saúde, a criança deve receber somente leite materno, excluindo-se água suplementar e chás, até 4-6 meses de idade, período em que o leite materno satisfaz única e exclusivamente todas as necessidades nutricionais da criança.

Diante dos resultados encontrados neste estudo, pode-se afirmar que a hipótese testada se confirmou, uma vez que a ampliação da infra-estrutura sanitária nos países com deficientes condições de saneamento ambiental é uma solução capaz de reduzir a mortalidade infantil e a mortalidade em menores de cinco anos de idade, melhorando as condições de saúde infantil e, portanto, a qualidade de vida existente nos países latino-americanos e caribenhos.

Concluindo, pode-se afirmar que a universalização da cobertura populacional por sistemas de abastecimento de água e por sistemas de esgotamento sanitário, a implantação de infra-estrutura urbana – principalmente nas cidades de grande e médio porte da América Latina e do Caribe -, o combate à desnutrição infantil e a ampliação da prevalência de aleitamento materno exclusivo até 120 dias de idade são medidas que, associadas à melhoria da cobertura por serviços de saúde, são de relevante importância para a melhoria da saúde infantil nos países da América Latina e do Caribe.

Leave a Reply

Your email address will not be published.