
Além das dificuldades de obtenção de recursos para investir em sistemas de coleta e tratamento de esgoto no Brasil, o que faz o país estar muito atrás neste quesito da infra-estrutura, as companhias e serviços municipais de saneamento começam a enfrentar uma outra ameaça: as demandas das comunidades contra os odores emanados pelos sistemas de tratamento.
Uma inédita demanda do Ministério Público do Rio Grande do Sul contra a Companhia Riograndense de Saneamento (Corsan) ameaça-a de ter que pagar uma indenização de mais de R$ 375 milhões a moradores de um bairro da cidade de Rio Grande por causa do odor exalado pela estação de tratamento de esgoto.
Reclamações deste tipo têm acontecido em várias partes do país levando os especialistas em Engenharia Sanitária a dedicar especial atenção a este assunto. Alternativas diversas vêm sendo testadas, desde aquelas que impõem o fechamento das ETEs para segregar os odores, até o uso de produtos químicos como o hipoclorito de sódio ou os derivados do tanino (esta uma promissora esperança, embora ainda pouco utilizada devido à falta de dados mais constantes e ao preço).
No caso da ETE da cidade de Rio Grande, segundo informa o superintendente da Tratamento da Corsan, Marinho Graff, o problema foi gerado pela inadequação do solo ao sistema inicialmente adotado – campos de infiltração – para o tratamento. Ele explica que o emissário tem uma extensão de cerca de 6 km o que facilita a formação dos compostos de enxofre e sulforosos. Por isto foi adotada a aplicação do hipoclorito na chegada do efluente à ETE.
Na opinião do especialista da Corsan uma das formas de minimizar o problema será escolher locais mais distantes de centros urbanos e evitar a adoção das lagoas anaeróbicas. O uso de ativadores biólogicos e de polímeros traz bons resultados mas ainda precisam ter preços mais compensadores, segundo Graff.
Pesquisadores analisam satisfação do cliente
Os pesquisadores Luiz Roberto Santos Moraes, Aline Soares de Souza,
Maria das Graças de Castro Reis, Silvio Roberto Magalhães Orrico e Pablo Souza de Figueiredo, da Bahia, elaboraram um estudo sobre a eficiência da ETE Fonte dos Padres, o nível de satisfaçãodos usuários e a percepção da população quanto ao funcionamento do sistema de esgotamento sanitário em Alagoinhas, (BA).
Segundo “a percepção geral dos habitantes, os maus odores são mais expressivos no período noturno. Em sua totalidade, os grupos indicaram que a ativação do sistema de esgotamento sanitário, concomitante à educação sanitária, contribuiu para uma acentuada redução de vetores, inclusive roedores”.
De acordo com a pesquisa realizada, concluiu-se que é evidente a satisfação dos usuários com o sistema de esgotamento sanitário implantado e em funcionamento, resultando em melhor nível de saúde, conforto e bem-estar, ou seja, na melhoria da qualidade de vida da população local.
“A percepção da população quanto a maus odores e vetores associados à localização e funcionamento da ETE não revela os mesmos como problemas, bem como não reduz o nível de satisfação com o sistema de esgotamento sanitário que a população passou a contar.
Biolfiltro em SC
Flavia Andréa da Silva Cabral, Paulo Belli Filho, Henrique De Melo Lisboa e Antonio Willemann realizaram um trabalho técnico sobre a aplicação de biofiltro em escala real na Estação de Tratamento de Esgoto do SAMAE de Orleans (SC). Segundo o estudo como resultados iniciais a eficiência de remoção foi acima de 90% para as análises realizadas.
O Departamento de Engenharia Sanitária da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) em parceria com o Serviço Autônomo de Água e Esgoto – SAMAE – do município de Orleans elaborou um projeto de pesquisa objetivando diagnosticar, monitorar e avaliar os incômodos olfativos provenientes da ETE do referido município, e implantar em suas instalações uma unidade de biodesodorização em escala real.
A ETE em questão é composta por um sistema de lagoas de estabilização (lagoas facultativas), administrado pelo SAMAE. O sistema é integrado por duas lagoas facultativas com área de 0,5 ha cada, profundidade de 1,30m e vazão média de 7 a 10 l/s. No trabalho os autores descrevem que “dentre as várias tecnologias aplicadas ao tratamento dos odores, a biofiltração, através de processo biológico, merece destaque. Este tipo de tecnologia quando comparada aos métodos físicos e químicos como a oxidação térmica, lavadores químicos, ozonização e adsorção por carvão ativado, apresenta como vantagem o baixo custo e baixa manutenção, não apresentando necessidade de adição de produtos químicos diariamente e troca do material filtrante continuamente”.
O biofiltro é um reator preenchido com material orgânico ou inorgânico povoado de microorganismos, onde os gases odoríferos atravessam a camada filtrante através de fluxo ascendente ou descendente. O meio filtrante deve ser úmido (50 – 80%) e possuir condições de funcionar como suporte bacteriano.
Segundo os pesquisadores “vários estudos mostram que um biofiltro adequadamente projetado e bem operado pode apresentar uma eficiência de remoção de contaminantes maior que 99%”.
Cientista mexicano reclama da falta de incentivo à comercialização

Adalberto Noyola Robles, do Instituto de Engenharia da Universidade Nacional Autônoma de México (UNAM), desenvolveu um biofiltro que foi considerado um dos casos de êxito da Ciência Mexicana, segundo a Academia Mexicana de Ciências.
De acordo com o pesquisador, este projeto atende a necessidade de controlar os maus odores das ETEs, o que faz com que essas instalações sejam rechaçadas pelas populações da vizinhança.
A vantagem desse processo é que o composto vegetal utilizado é muito barato e pode ser aproveitado para melhorar a qualidade dos solos . Noyola lamenta que, até o momento, não tenha havido interesse e nem um sistema adequado para sua comercialização, apesar dos bons resultados de vários protótipos instalados.
Segundo ele no México, o pesquisador tem que desenvolver a tecnologia e trabalhar na comercialização de seu produto, o que gera frustração, porque é uma tarefa alheia ao labor dos cientistas.
Cobertura em Piracicaba

A Estação de Tratamento de Esgoto do Piracicamirim, em operação desde 1997, trata atualmente 33% do esgoto coletado em Piracicaba (SP). Apresenta eficiência na remoção de compostos orgânicos poluentes acima de 90% e contribuiu para a despoluição do ribeirão Piracicamirim. Desde 2002, o Semae (Serviço Municipal de Água e Esgoto) vem buscando soluções para minimizar a geração do odor e todas elas resultaram em melhorias. Porém, não eliminaram definitivamente o problema. O uso de filtro de escória de ferro (redução de enxofre em 50%), alterações operacionais, entre outras medidas, foram as últimas ações para amenizar o problema.
Após a aplicação das várias alternativas, concluiu-se pela execução de cobertura especial com fechamento completo dos reatores anaeróbicos (tanques que geram os odores). O projeto foi adquirido em 2005 e, atualmente, o Semae está executando as obras de cobertura de um dos tanques para, em seguida, cobrir os demais. Essa ação foi projetada em conjunto pela Promotoria Pública, Cetesb e representantes dos bairros vizinhos.
Problema comum
ETE de Piracicaba
A Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) Uberabinha ( Uberlândia – MG) está sendo equipada com um neutralizador de odores. A decisão de implantar o equipamento ocorreu após estudos e testes realizados em Uberlândia, nos meses de fevereiro e março, que comprovaram a eficiência da tecnologia. Para analisar a viabilidade do processo, engenheiros do Departamento Municipal de Água e Esgoto (Dmae) fizeram uma visita técnica à Companhia de Saneamento de Campinas (Sanasa), onde estão instalados dois tipos de neutralizadores.
A ETE Uberabinha opera com um índice de eficiência compatível aos padrões exigidos pelos órgãos reguladores (COPAM 10/86 e CONAMA 357). Atualmente, o problema é controlado com a utilização de aditivos biológicos à base de bactérias, que promovem a redução do odor. No entanto, em alguns períodos, o sistema da ETE desestabiliza devido aos esgotos não domésticos que chegam na estação sem qualquer tipo de tratamento. Este é o principal motivo do aumento no nível de odor.
Projeto Bom Vizinho
Em uma outra linha de pesquisa, desta vez envolvendo a Companhia de Águas de Joinvillle (SC), Claudia Rocha, Marcio Ravadelli e Pedro Toledo Alacon descrevem que na tentativa de minimizar a emissão de odores na ETE, utilizava-se até então, a um custo médio de R$ 50.000,00/mês, hidróxido de sódio (soda cáustica), com o objetivo de solubilizar o gás já produzido. Além do alto custo e de não apresentar o resultado esperado no controle de odores, o hidróxido de sódio inibe os microrganismos envolvidos no processo de degradação biológica.
Na busca de uma solução definitiva a Companhia Águas de Joinville optou por avaliar uma concepção alternativa para o controle de odores, utilizando microorganismos selecionados na própria unidade de tratamento e replicados em meio nutriente específico.
Inicialmente foram coletadas amostras nas lagoas para caracterização da flora microbiana e seleção de microrganismos de interesse, não modificados geneticamente. Estes microrganismos selecionados foram replicados em meio nutriente à base de melaço de cana, ativados e dosados no início do tratamento anaeróbio (inóculo microbiológico).
Para avaliar o andamento dos trabalhos, além do controle operacional realizado através de análises laboratoriais cotidianas (DBO, DQO, pH,…), a participação da comunidade foi de fundamental importância. Foram cadastradas 236 residências, em dois bairros circunvizinhos a unidade de tratamento (Jarivatuba e Paranaguamirim), para as quais foram distribuídas formulários para o acompanhamento do projeto durante três meses. Nestes formulários, os moradores registraram, diariamente, sua percepção em relação à presença de odores, sendo as opções: Insuportável, muito forte, forte, fraco e ausente.
Na conclusão do estudo os autores observam que “embora tenha sido observada uma redução geral em torno de 18% na emissão de odores na ETE-Jarivatuba, e considerando a ocorrência de alguns problemas operacionais durante o período analisado, a utilização da biotecnologia aplicada ao saneamento se mostrou uma ferramenta promissora no controle de processos biológicos. Esta ferramenta, associada a algumas medidas operacionais simples e de baixo custo, podem otimizar os resultados, sendo relevante o desenvolvimento de estudos futuros que contemplem esta abordagem”.
E alertam que em função da escassez de bibliografia a respeito da inoculação de microrganismos em sistemas de tratamento de esgotos sanitários, a metodologia científica em experiências desta natureza é essencial para que a sua utilização seja difundida.

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