
Cecy Oliveira – jornalista – editora da Revista Digital Aguaonline – agua@aguaonline.com.br
Os conceitos de doença, saúde ou cuidados médicos refletem sempre os valores, crenças e práticas aceitas pelo conjunto da sociedade. A figura do médico – ou do curandeiro nas comunidades tribais – e o carisma que a acompanha estão presentes em todos os tempos e todas as culturas. Daí a noção de saúde estar intimamente ligada à ausência de doenças. Levando-se em conta ainda os avanços nas práticas curativas dos últimos 30 anos o reforço do poder mágico da Medicina tem difundido a idéia de que os símbolos mais adequados para as políticas de Saúde têm que ser imensas redes de atendimento médico-hospitalar.
À exceção das campanhas de vacinação, as atividades desenvolvidas e recursos gastos em Saúde na maioria dos países destinam-se ao pagamento de atendimentos médicos e procedimentos laboratoriais e hospitalares.
A Puericultura é disciplina banida das escolas e prática obsoleta na maioria dos postos de Saúde, mesmo em países como o Brasil onde cerca de 33,7 milhões de habitantes são considerados pobres. Até mesmo o incentivo à amamentação foi deixado de lado por muitos anos e só recentemente vêm sendo realizadas campanhas em veículos de Comunicação de alguns países.
Mesmo tendo presente que cerca de 65% das internações hospitalares são devidas a doenças de veiculação e origem hídrica os governos têm investido muito pouco na melhoria da infra-estrutura sanitária nos países em desenvolvimento. Só no Brasil são mais de 40 milhões de habitantes sem água tratada e 90 milhões sem serviços de coleta e tratamento de esgotos adequados. Esta mesma proporção se verifica na maioria dos países em desenvolvimento.
Já nos países desenvolvidos, onde as condições sanitárias e sociais possibilitaram uma sensível melhoria na qualidade de vida, problemas ambientais, stress e violência vêm se tornando fatores preocupantes para as políticas de Saúde.
Em busca de um conceito de Saúde que pudesse se adequar às novas situações o médico canadense Marc Lalonde publicou em 1974 um relatório em que chamava a atenção para a ênfase que vinha sendo dada à Medicina curativa em detrimento da prevenção. Dizia que se prestava atenção demais à “organização dos cuidados médicos apesar de termos identificado nas primeiras causas de mortalidade razões baseadas em três conceitos: biologia, meio ambiente e estilos de vida”. E concluía: “Parece evidente, portanto, que vultosas somas de dinheiro estão sendo gastas erroneamente somente para tratar as enfermidades e não preveni-las efetivamente”.
Este alerta foi o ponto de partida para que em 1986 a Conferência sobre Saúde realizada na cidade de Ottawa, no Canadá reconhecesse como pré-requisitos fundamentais para a Saúde: “a paz, a educação, a habitação, o poder aquisitivo, um ecossistema estável, a conservação dos recursos naturais, a justiça social e oportunidades iguais para todos”..
Neste mesmo ano os americanos Leonard Duhl e Trevor Hancock usaram pela primeira vez o termo “cidades saudáveis” enfatizando o papel do município na promoção da saúde. Para eles “uma cidade é saudável quando coloca em prática, de modo contínuo, a melhoria de seu ambiente físico e social, utilizando os recursos de sua comunidade com o objetivo de permitir a seus cidadãos uma aptidão de ajuda mútua em todas as atividades humanas que levem a sua plena realização”.
A partir de 1990 a Organização Mundial da Saúde (OMS) passou a incentivar em todo o mundo a implantação de projetos dentro da orientação dos Municípios Saudáveis ressaltando porém que eles devem complementar os sistemas de saúde e não substituí-los. Na América Latina a adoção da proposta tem sido mais lenta do que nos países desenvolvidos onde já existem verdadeiras redes de Municípios Saudáveis.
Ao adotar a proposta de Município Saudável uma comunidade – significando não só os seus órgãos públicos, mas entidades e cidadãos – deve começar a desenvolver uma série de iniciativas cada qual contribuindo, dentro de sua esfera e seu setor, para a identificação dos problemas da saúde e de suas causas subjacentes e na ação para enfrentá-las.
Exemplos
1) Prevenir a violência
2) Melhoria no abastecimento de água
3) Saneamento e atenção à saúde
4) Programas de crédito para melhorias habitacionais
5) Áreas de recreação
Mas o que é um Município Saudável?
Em princípio, é o lugar onde as pessoas podem ser felizes. E para isso devem ser atendidos pelo menos os seguintes pré-requisitos:
# Ambiente limpo, seguro e de alta qualidade;
# Ecossistema estável e sustentável a longo prazo;
# Uma comunidade solidária com apoio recíproco;
# Elevado grau de participação e controle por parte da população nas decisões que afetam sua própria vida, saúde e bem-estar;
# Satisfação das necessidades básicas (alimentos, água, habitação, recursos, segurança e trabalho);
# Acesso a novas experiências;
# Economia inovadora, diversificada;
# Incentivo à vinculação com o passado e herança cultural;
# Ótimo nível dos serviços de saúde pública e atenção aos doentes acessível a todos;
# Boa situação sanitária.
É preciso deixar claro que a saúde de uma pessoa pode ser tanto o resultado das condições de habitação, da escola, do trabalho, como a atenção de saúde de que dispõe.
Saúde para todos implica portanto em:
1) Reduzir as desigualdades
2) Dar ênfase à prevenção e cuidados primários
3) Cooperação intersetorial incluindo redução de riscos ambientais
4) Participação comunitária
Estariam errados os médicos que forneceram as bases para a proposta de município saudável em vincular a manutenção da saúde também a fatores extra médicos e hospitais?
Seriam visionários os chefes de Estado que aprovaram a Agenda 21 onde é reconhecido que só é possível haver saúde se o meio ambiente for saudável, se a água for segura?
Este laço de dependência entre saúde e ambiente é lembrado de maneira eloqüente pela Agenda 21, aprovada pela Conferência do Rio, no seu capítulo 6, consagrado à “Proteção e Promoção das Condições da Saúde Humana”. E também no Cap. 18 cujas estatísticas citadas deixam evidente esta interdependência:
“Estima-se que 80% de todas as moléstias e mais de 1/3 dos óbitos dos países em desenvolvimento sejam causados pelo consumo de água contaminada e, em média, até 1/10 do tempo produtivo de cada pessoa se perde devido a doenças relacionadas com a água. Uma em cada três pessoas do mundo em desenvolvimento ainda não conta com água potável segura e saneamento”. (Agenda 21 – Capítulo 18 – 18.47).
O exemplo, dolorido ainda, de Nova Orleans ter se tornado praticamente inabitável devido ao colapso de seu sistema sanitário não seria motivo relevante para uma análise mais cuidadosa pelo Congresso?
Será que as lições dos países desenvolvidos onde as boas condições de infra-estrutura – principalmente o acesso à água e serviços de esgoto – são a base do progresso e qualidade de vida não deveriam ser levadas em conta?
Esperemos que o bom senso prevaleça e nossos parlamentares revejam essa proposta insana.
Opinião dos Leitores
Nome: Eng.Agr° Wolfgang Krause
E-mail:wolfkrause@hotmail.com
Desvincular o Saneamento da Saúde só é vantajoso para os médicos, fabricantes de medicamentos pois quanto menos higiene e preservação da qualidade de Saneamento, mais doenças e quem lucra são eles.
Será que é isto que a população almeja (doença em vez de Saúde)?
Se isto prevalecer é melhor acabar com o Brasil.
Pesquisa Aguaonline
Este tema já foi abordado em várias matérias da Aguaonline.
Confira abaixo algumas delas:
Aguaonline 18 – Prevenção pode evitar 13 milhões de mortes
“Os desastres naturais – como terremotos e inundações – a AIDS e as diarréias são responsáveis por pelo menos 13 milhões de mortes no mundo e que poderiam ter sido evitadas, segundo informes divulgados pela Cruz Vermelha Internacional. A prevenção pode ser feita com medidas simples como vacinações, fornecimento de água potável e saneamento ambiental. Na maioria dos países mais de 70% dos gastos com saúde são direcionados aos grandes hospitais.
Conforme os especialistas com menos de US$ 5,00 por pessoa/ano é possível obter o controle de muitas doenças. “Não é somente uma questão de remédios e tecnologia. É preciso cuidar da nutrição, educação, abastecimento de água potável, vacinação e assistência materno-infantil para manter a saúde” dizem.
Um estudo divulgado pelo jornal Los Angeles Times indicou que além de provocar problemas respiratórios a poluição do ar pode alterar o ritmo cardíaco e provocar enfartes. As estimativas são de que a poluição seja responsável por 1% das mortes causadas por ataque cardíaco nos Estados Unidos, ou o equivalente a 10 mil óbitos por ano”.
Leia o texto completo em: Prevenção pode evitar 13 milhões de mortes
Aguaonline 73 – Doenças respiratórias pioram com o efeito-estufa
“Enquanto os ambientalistas cerram fileiras contra a intenção do Governo Bush de amenizar as restrições impostas pelo Ato do Ar Limpo (Clean Air Act) a publicação de um estudo pela revista Science sobre as mortes associadas à contaminação atmosférica dá mais munição aos que defendem a adoção de multas pesadas e de novas tecnologias para o controle das emissões.
Segundo o estudo uma redução em torno de 10% na emissão de gases que provocam o efeito-estufa nas cidades com ar mais poluído, entre as quais estão a Cidade do México, São Paulo, Nova Iorque e Santiago do Chile, poderia evitar a morte da mais de 69 mil pessoas e a perda de 37 milhões de dias de trabalho nos próximo 20 anos.
Vários estudos realizados pela OMS indicam que em média mais de 400.000 mortes registradas a cada ano no mundo poderiam ser evitadas se houvesse um esforço coletivo para a diminuição da contaminação atmosférica. Segundo a OMS as afecções por contaminação do ar por fontes internas ou externas são uma das 10 primeiras causas de incapacidade, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS)”.
Leia a íntegra da matéria em: Doenças respiratórias pioram com o efeito-estufa
Aguaonline 33 – A doença das cidades – artigo de Ernesto Ubiratan Marchiori
“Para os que dependem dos serviços públicos, o atendimento médico hospitalar tornou-se um drama nos grandes centros urbanos. Virou rotina a falta de médicos ou de vagas em ambulatórios e hospitais superlotados.
Ainda de madrugada, em enormes filas para marcar uma simples consulta, mesclam-se o desespero de mães com filhos nos braços e o silêncio conformado de idosos com o rosto marcado pela desesperança e pela tristeza. Na urgência, parentes atarantados arrastam seus doentes de porta em porta, na tentativa de conseguir uma internação.
Muitas destas doenças estão relacionadas à baixa qualidade das águas e devido à falta de saneamento básico em nossas cidades.
O problema, na verdade, é que, ao invés de políticas de saúde, temos “políticas de doença”.
Embora seja indispensável assegurar tratamento aos que necessitam, a saúde pública precisa, antes de tudo, do trabalho preventivo que não se esgota em campanhas de vacinação, mas depende da qualidade de vida no meio urbano.
Os governantes há muito, esqueceram-se da importância do urbanismo e saneamento para a saúde pública, relegando medidas elementares de combate às doenças.
A saúde depende também da geração de empregos e da distribuição da renda, mas a prevenção de doenças começa pelo saneamento e pela condição das habitações. Infelizmente, a maioria dos municípios – que têm responsabilidade direta pelas cidades – pouco tem feito para garantir seu ordenamento e para assegurar parâmetros mínimos de salubridade ambiental.
Leia a íntegra do artigo no arquivo abaixo:

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