
“O acesso à água é um direito vital para a dignidade de todos os seres humanos”, declarou a diretora geral da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), Audrey Azoulay “.
Segundo dados da entidade em 2015, três entre dez pessoas (2,1 bilhões) não tinham acesso à água potável segura, e 4,5 bilhões de pessoas, ou seis entre dez, não tinham instalações sanitárias geridas de forma segura.
A nova edição do Relatório Mundial das Nações Unidas sobre Desenvolvimento dos Recursos Hídricos mostra que a determinação coletiva para avançar, bem como esforços para incluir aqueles que foram deixados para trás no processo de tomada de decisões, são fatores que podem transformar esse direito em realidade.
“Como mostra o relatório, se a degradação do meio ambiente natural e a pressão insustentável sobre os recursos hídricos mundiais continuarem a ocorrer nas taxas atuais, 45% do Produto Interno Bruto (PIB) mundial e 40% da produção mundial de grãos estarão em risco até 2050”, disse Gilbert F. Houngbo, diretor da ONU-Água e presidente do Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola (FIDA).
“As populações pobres e marginalizadas serão afetadas de forma desproporcional, aumentando ainda mais as desigualdades crescentes (…). O relatório de 2019 fornece evidências da necessidade de se adaptar as abordagens, tanto nas políticas quanto na prática, para tratar das causas da exclusão e da desigualdade”, concluiu.
Em escala mundial, metade das pessoas que bebem água retirada de fontes não seguras vivem na África. Na África Subsaariana, apenas 24% da população têm acesso à água potável segura, e 28% têm instalações sanitárias básicas que não são compartilhadas com outras residências.
Discrepâncias importantes quanto ao acesso existem até mesmo dentro dos países, de forma clara entre pessoas ricas e pobres. Em áreas urbanas, as pessoas
desfavorecidas que vivem em acomodações improvisadas sem água corrente muitas vezes pagam de dez a 20 vezes mais do que seus vizinhos, em bairros mais ricos, por uma água de qualidade similar ou inferior comprada de vendedores ou de caminhões-pipa.
O direito à água, como explicam os autores do relatório, não pode ser separado de outros direitos humanos. Na verdade, aqueles que são marginalizados ou discriminados também têm maior probabilidade de ter um acesso limitado ao saneamento básico (1) adequados.
Quase metade das pessoas que bebem água retirada de fontes desprotegidas vivem na África Subsaariana, onde a coleta recai principalmente sobre as mulheres e meninas, muitas das quais gastam mais de 30 minutos em cada viagem para buscar água. Sem saneamento seguro e acessível, essas pessoas provavelmente enfrentarão múltiplos desafios, incluindo saúde e condições de vida precárias, desnutrição e falta de oportunidades de educação e emprego.
Os refugiados e pessoas deslocadas internamente com frequência enfrentam sérios obstáculos para ter acesso ao fornecimento de água e a serviços sanitários, e a quantidade de pessoas nessas situações é mais alta do que nunca.
Em 2017, conflitos e perseguições forçaram 68,5 milhões de pessoas a fugirem de seus lares. Além disso, uma média anual de 25,3 milhões são forçadas a migrar por causa de desastres naturais, o dobro de pessoas na mesma situação no início da década de 1970 – espera-se que esse número aumente ainda mais devido às mudanças climáticas.
São necessárias políticas inclusivas para se alcançar o Objetivo de Desenvolvimento do Milênio (ODS) 6 (2). Elas também são importantes para neutralizar conflitos entre diferentes usuários da água. Em um contexto de demanda crescente (1% de crescimento anual desde a década de 1980), o relatório observa um aumento significativo dos conflitos relacionados à água: 94 de 2000 até 2009, e 263, de 2010 até 2018.
O documento também demonstra que investir em saneamento faz sentido em termos econômicos. O retorno do investimento é alto em geral e também no caso específico das pessoas vulneráveis e desfavorecidas, especialmente quando são considerados benefícios mais amplos, como saúde e produtividade. O fator multiplicador para o retorno do investimento foi estimado mundialmente em 2 para a água potável, e em 5,5 para o esgotamento sanitário.
Coordenado e publicado pelo Programa Mundial de Avaliação dos Recursos Hídricos (WWAP) da UNESCO, o Relatório Mundial das Nações Unidas sobre Desenvolvimento dos Recursos Hídricos é o resultado de uma colaboração entre 32 entidades das Nações Unidas e dos 41 parceiros internacionais que compõem a ONU-Água. O relatório é publicado todos os anos em 22 de março, Dia Mundial da Água.
Inundações e secas
De modo geral, as áreas secas tenderão a se tornar ainda mais secas, e as áreas úmidas, mais úmidas, pois é provável que as mudanças climáticas aumentem o estresse hídrico (3) nas áreas que já são as mais afetadas.
Cerca de 90% de todos os desastres naturais são relacionados à água.
Ao longo do período de 1995–2015, as inundações responderam por 43% de todos os desastres naturais registrados, afetando 2,3 bilhões de pessoas, matando mais de 157 mil e causando US$ 662 bilhões em prejuízos (CRED/UNISDR, 2015).
As secas responderam por 5% dos desastres naturais, afetando 1,1 bilhão de pessoas, matando mais de 22 mil e causando US$ 100 bilhões em prejuízos durante o mesmo período de 20 anos (CRED/UNISDR, 2015).Em média, 25,3 milhões de pessoas são deslocadas todos os anos por desastres de início súbito (IDMC, 2018).
Enquanto os números podem variar muito de um ano para outro, dependendo da ocorrência e da intensidade dos desastres, o risco geral de ser deslocado por desastres duplicou desde os anos 1970, principalmente devido ao crescimento populacional e à maior exposição e vulnerabilidade a perigos naturais, uma tendência que provavelmente continuará com os efeitos adversos da mudança climática.
Estão excluídas desses números as pessoas que se deslocam devido a desastres de início lento e a outros fatores de pressão (como, por exemplo, seca crônica, aumento do nível do mar, desertificação e perda de ecossistemas, entre outros), pois, com frequência, as causas desses deslocamentos são complexas.
Existem evidências crescentes de que o esgotamento de recursos naturais, como a água, devido a uma combinação de uso excessivo, degradação ambiental e mudança climática, pode ser uma das principais causas das migrações (FAO/GWP/Oregon State University, 2018).
Estima-se que as mudanças climáticas aumentem a frequência e a intensidade dos eventos climáticos extremos.
Entre os países que apresentavam uma cobertura menor do que 95% em 2015, apenas um em cada cinco está no caminho para alcançar o acesso universal a serviços hídricos básicos até 2030 (UN, 2018a).
Também ocorreu progresso na cobertura do esgotamento sanitário ao longo da fase de implementação dos ODMs. Em 2015, 154 países já haviam atingido uma cobertura de mais de 75% de serviços sanitários básicos, pelo menos. Entre 2000 e 2015, a proporção da população mundial que dispõe de pelo menos um serviço básico de saneamento aumentou de 59% para 68%.
Qualidade da água
Em todo o mundo, mais de 80% das águas residuais retornam ao meio ambiente sem tratamento (WWAP, 2017).
Várias doenças relacionadas à água, inclusive a cólera e a esquistossomose, continuam sendo amplamente difundidas em muitos países em desenvolvimento, onde apenas uma proporção muito pequena (em alguns casos, menos de 5%) das águas residuais domésticas e urbanas são tratadas antes de seu despejo no meio ambiente (WWAP, 2017).
Inundações e secas 2
Em todo o mundo, apenas 2,9 bilhões de pessoas (ou 39% da população mundial) dispunham de serviços sanitários gerenciados de forma segura em 2015.
Duas de cinco dessas pessoas (1,2 bilhão) viviam em áreas rurais. Outros 2,1 bilhões de pessoas tinham acesso a serviços “básicos” de esgotamento sanitário. Os 2,3 bilhões remanescentes (uma em cada três pessoas) não dispunham nem mesmo de um serviço sanitário básico; destes, 892 milhões de pessoas ainda realizavam a defecação a céu aberto (WHO/UNICEF, 2017a).
Em 2015, entre os países com uma cobertura menor do que 95%, apenas um em dez está no caminho para alcançar o acesso universal ao saneamento básico até 2030 (UN, 2018a). Os resultados do estudo “Análise e avaliação mundial sobre saneamento e água potável”, realizado em 2017 pela UN-Water sugerem que, em muitos países, a insuficiência de recursos financeiros é um grande empecilho para se obter níveis mais altos de investimento.
Embora os orçamentos governamentais para abastecimento de água, esgotamento sanitário e higiene (water supply, sanitation and hygiene – WASH, na sigla em inglês) aumentem a uma taxa média anual real de 4,9%, mais de 80% dos países monitorados relatam dispor de financiamento insuficiente para alcançar suas metas nacionais em áreas urbanas, ao passo que tal proporção aumenta para 90% quando se trata de áreas rurais.
Uso de instalações melhoradas que não são compartilhadas com outras residências, e nas quais os excrementos são eliminados de forma segura, no próprio local (in situ) ou transportados e tratados em outros locais (instalações “melhoradas” incluem banheiros com descarga automática ou por despejo manual de água conectados a sistemas de esgoto canalizado, tanques, fossas sépticas ou latrinas; latrinas ventiladas aprimoradas, sanitários de compostagem ou latrinas cobertas com placas).
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