Sustentabilidade é vital para sobreviver à crise

Miguel Fontes

Muitos se referem ao ano de 2008 como “um ano difícil”. Devido à crise financeira mundial e aos diversos problemas ambientais, muitos acham que, em comparação a 2008, o ano de 2007 foi “um ano espetacular”. No meu ponto de vista, o ano passado apenas trouxe à tona questões que se têm arrastado ao longo da década, e que tomaram proporções ainda mais significativas no decorrer do ano.

Tempos ruins, na verdade, foram aqueles nos quais tudo parecia bem, porém, logo se revelou a sujeira que estava sendo arrastada para baixo do tapete, como a sangrenta Guerra do Iraque, o descontrole do crédito mundial para financiar o setor imobiliário norte-americano, a devastação incontrolada do meio ambiente para gerar matéria-prima na produção de mercadorias chinesas, e a falta de investimentos na área de saúde e educação em diversos países.

O ano de 2008 não foi difícil, foi revelador! E uma das principais revelações foi a importância do investimento social e governamental para sustentar as dinâmicas de mercado. O mercado comercial e o de crédito não conseguem se sustentar sozinhos. É preciso investimento contínuo por parte do governo em infra-estrutura, educação e saúde da população. Ao mesmo tempo, a sociedade, representada por suas empresas e organizações sociais, precisa ter consciência de sua importância para a adoção de conhecimentos, atitudes e práticas as quais reduzem os prejuízos visíveis para o meio-ambiente.

As lições de 2008 deverão ser levadas em consideração na elaboração de políticas mundiais que precisam se sustentar pelas próximas décadas.

As empresas buscam esse artifício, pois já estão viciadas nas soluções de curto prazo e na lógica de que mais consumo é igual a mais produção. No entanto, precisamos levar aos governantes e aos empresários a visão sobre a importância do investimento sócio-ambiental como ingrediente fundamental para evitar novas crises e garantir a sustentabilidade do planeta e da sociedade. Não adianta, por exemplo, alguém aumentar seu consumo de refrigerantes e depois jogar as latas na rua.

O governo e as empresas podem até achar interessante, em um curto período de tempo, que o consumo realizado tenha gerado empregos e renda, mas a cadeia sócio-ambiental estará, novamente, sendo destruída com o aumento do custo da matéria-prima e a possibilidade de que essa mesma lata seja um refúgio para o mosquito da dengue, por exemplo.

A cadeia sócio-ambiental se enriquecerá somente se os investimentos sociais atingirem patamares bem elevados. Espero que essa lição faça parte do processo decisório das empresas e dos governos. Além disso, torço para que a dinâmica produção-crédito-consumo seja substituída por uma nova dinâmica de produtividade sócio-ambiental – crédito responsável – consumo consciente. A necessidade de qualificação dessa dinâmica é a maior lição de 2008. Considero 2009 o ano ideal para marcar o início de uma nova era de enriquecimento das relações humanas e ambientais.

Solução simplista

Saio de 2008 com a sensação de que a máxima protagonizada por muitos de que o mercado comercial traz claros benefícios sociais como a empregabilidade da população, foi finalmente sepultada.

O governo e as empresas erram em achar que para resolver o problema atual da crise financeira precisamos de acesso ainda mais fácil ao crédito. Isso talvez tenha algum efeito no curtíssimo prazo e é justificável pela eleição presidencial estar se aproximando.

Autor

Miguel Fontes é diretor da John Snow Brasil, doutorando em saúde pública internacional pela John Hopkins University, e autor do livro Marketing Social – Novos Paradigmas, da editora Campus/Elsevier

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