Poluição das praias

Natália Ribeiro do Valle.

Estou cansada, apesar dos meus poucos 28 anos, desta falta de responsabilidade. Os brasileiros se adaptaram a fingir que não estão vendo as coisas erradas acontecendo para não terem o trabalho de arrumar a casa. Fingem que só fazem o bem, que estão alicerçados em princípios sólidos de ética e moral. Fingem que são decentes. Ou, pior, acreditam que são espertos por agirem dessa maneira.

Este texto é um desabafo que escrevi na madrugada do dia 1º de janeiro de 2009, quando um novo ano se iniciava e eu deveria estar cheia de esperança. Ao invés disso, meu desespero me tirou da cama. A cena que presenciei no último dia de 2008 não saía de minha cabeça.

Na tarde de 31 de dezembro de 2008, resolvi, em companhia de meu marido, sair para tomar um banho de mar na Praia das Toninhas. Mesmo sabendo, mas fingindo não saber, como é o costume do povo brasileiro, que há mais de 20 anos ali vem sendo despejado esgoto advindo dos Condomínios Wembley, um fiozinho de esperança me restava. Algo poderia ter mudado. Afinal, chegam a milhares os telefonemas para a Cetesb e outros órgãos responsáveis pelo meio ambiente, pela saúde e pelo saneamento durante os últimos anos. Eu e minha família seguramente fomos responsáveis por centenas deles.

Infelizmente, bastou nos aproximar para perceber que tudo permanece como antes. Assim mesmo, decidimos ficar na praia para caminhar até a outra ponta e tomar distância desses condomínios e seus fétidos esgotos.

Para nossa surpresa o riacho, localizado ao lado da antiga casa noturna Sunset, estava, sem exageros, marrom e fedendo. Nunca havia visto aquele riacho tão cheio. E, pelo visto, com a maré alta, as coisas só pioram. O que mais me chocou foi ver as pessoas se banharem, incluindo crianças, fingindo não estarem percebendo e assim não precisando perder seus preciosos momentos de lazer e férias para ir aos órgãos públicos reclamar. Afinal isso dá trabalho, eu bem sei. Ficamos ilhados. Atravessar aquele riacho sem tocá-lo era impossível e tivemos que voltar.

O pior foi ter que ouvir de um funcionário que não há problema em lançar esgoto ao mar. O tom do atendente não escondia sua indiferença. Afinal, o que pretendia aquela chata ligando insistentemente durante o Natal e o Ano Novo, quando o esgoto é mais volumoso em razão da total ocupação dos apartamentos daquele condomínio nessa época? Acabar com seus dias? Fazê-lo se deslocar até o local? Só por causa de uma avalanche de dejetos lançada ao mar, onde se banham crianças, mulheres, famílias inteiras?

Ainda pior foi ouvir de outro funcionário, “bem intencionado”, que o esgoto desses condomínios é tratado. Mas o cheiro arde em meu nariz sempre que passo pelo local. Será esse cheiro fruto da minha fértil imaginação?

Escrevi como um desabafo, mas espero solução. Por isso, aproveito para apelar ao Ministério Público Federal e Estadual, bem como ao prefeito de Ubatuba e ao governador do Estado de São Paulo, para que tomem as medidas cabíveis com a urgência que a situação merece. Alerto que as denúncias que eu e minha família fizemos a todos os órgãos, desde a primeira semana de dezembro, não tiveram qualquer resposta, e estão devidamente documentadas.

Comentário do leitor (2)

O problema todo, ou ao menos em sua grande parte, não é de difícil solução. Basta vontade política de se criar uma lei obrigando a que os condomínios tratem seus dejetos antes de os lançarem no meio ambiente; e a obrigatoriedade de projeto já previsto na planta para novos empreendimentos.

Marco Antonio.

Espécie em extinção

Indignada, percebi que todo meu esforço, meu tempo gasto em inúmeras ligações à Cetesb durante todo o mês de dezembro denunciando o que acabava de presenciar tinha sido em vão. Foi como um filme em minha mente.

Eu e meus familiares somos considerados ´os chatos´ de Ubatuba. Não me importo, sei que é esse o adjetivo que se dá aos brasileiros, em extinção, que querem cumprir a lei, viver honestamente com rigorosos princípios morais e éticos, e exigir o mesmo do próximo.

Vale a nossa consciência em não nos juntar ao grupo daqueles que fingem.

Autora

Natália Ribeiro do Valle é advogada, especialista em terras de Marinha, do escritório Ribeiro do Valle Associados.

Comentário do leitor (1)

É triste ter que presenciar essa situação de nossas praias… É bom ver que ainda há indignação com tal situação! Quando a indignação e a vontade de cobrar providências das autoridades omissas, assim como da sociedade que se cala diante de uma ameaça a sua própria segurança e saúde, aí sim, acaba a esperança de que as coisas melhorem algum dia…

Cleveland M Jones.

Comentário do Leitor (3)

O problema maior é a falta de interesse do Estado de São Paulo em resolver situações como está, infelizmente é uma característica de todo o nosso País. Existem tecnologias bem acessíveis e sustentáveis para estes casos, como a utilização de biorremediadores. Eu já usei e achei ótimo.

Carlos Eduardo.

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