As lições que é preciso aprender com o passado

Cecy Oliveira – especial Guatemala.

Uma visita à cidade histórica de Tikal, na Guatemala, retrato da civilização maia que dominou parte da América Central pouco antes e até mais ou menos 800 anos DC dá idéia de como era a convivência deles com o meio ambiente natural. O acerto no aproveitamento da água da chuva, ao construírem imensos reservatórios, ou o desflorestamento intenso, para dar lugar à cidade que crescia, e que acabou provocando mudanças no regime de precipitações gerando estiagem, fome e desnutrição,

Atualmente apenas 15% da antiga cidade estão à vista dos turistas que visitam Tikal. O restante ainda permanece recoberto pela floresta tropical onde se sobressaem árvores gigantescas, como os zapotes, cuja seiva é usada como matéria-prima para a fabricação da goma de mascar, cenário ideal para as mais de 285 espécies de pássaros, macacos e outros animais selvagens como o puma, o javali e os jaguares, estes símbolos sagrados para os maias.

Percorrendo as trilhas do Parque percebe-se a identidade das ruínas com outros locais da região, como Chichen Itzá e Tulum, na península de Yucatán, no México, sugerindo que depois do apogeu da cidade guatematelca os maias teriam rumado para o norte.

Especula-se inclusive que o abandono teria, para além das lutas de conquistas, um fator climático – uma grande estiagem – como desencadeador da crise civilizatória. Ainda que, paradoxalmente, os últimos resquícios da cultura maia tenham sucumbido aos espanhóis em 1697, às margens do lago Peten Itzá, próximo de onde está hoje a cidade de Flores, capital da Província de Petén.

Especialistas que têm se dedicado ao estudo das causas da decadência de Tikal, como Tom Sever, cientista do Centro Espacial Marshall, da NASA, especulam que as conseqüências da remoção de grandes extensões de cobertura vegetal podem ter provocado mudanças não somente no clima (menos chuvas e temperaturas mais altas) como nas condições do solo transformando-o em impróprio para o cultivo. Sever tem convicção de que as mudanças climáticas atuais podem ter uma relação muito estreita com o que se passou com a civilização maia que floresceu em Tikal há mais de 2.000 anos.

Por outro lado, o legado de coleta de água de chuva e a sua distribuição por redes de canais ainda hoje presentes no meio da floresta – que voltou a crescer a ponto de encobrir templos e pirâmides de mais de 80 metros de altura – dão indícios de como os maias contornaram a falta de mananciais de superfície nas proximidades e a inexistência de fontes subterrâneas acessíveis. Esses canais de irrigação podem ter sido a tentativa de evitar a continuidade da devastação florestal possibilitando o aproveitamento das terras “baixas” na estação seca.

O certo é que entre a verdade e o mito – fala-se de sete profecias maias que alertariam para as mudanças climáticas, devastação florestal, aquecimento e perigo de derretimento das calotas polares – há lições que deveriam ter sido apreendidas com o esplendor e declínio das civilizações.

Uma delas certamente é conhecer e se adaptar às condições “naturais”. Como não temos feito ao longo dos anos.

Nossas cidades aprisionam rios e córregos, tiram-lhes a proteção das matas ciliares e carreiam diariamente lixo e detritos para seu leito, além de continuarem despejando toneladas de esgoto doméstico sem tratamento em suas águas.

E ainda nos surpreendemos quando após uma chuva mais intensa eles transbordam e inundam tudo ao redor. Ou, ao contrário, quando a estiagem faz baixar a vazão expondo dramaticamente a poluição e provocando mortandades de peixes.

Isto sem mencionar a derrubada de árvores centenárias para plantar soja em um solo impróprio que após quatro ou cinco colheitas se revela estéril. Ou seja”nem florestas, nem colheitas.

Autora

Cecy Oliveira é editora da Aguaonline e esteve em Tikal (Guatemala) no mês de agosto de 2007.

Conhecer Tikal

Em uma área de 16 km², na parte central de Tikal – cerca de 500 km a noroeste de Cidade da Guatemala – foram contabilizadas cerca de 3.000 edifícios, entre templos, palácios, plataformas para cerimônias, residências, campo para jogo de bola, praças, mercados.

As escavações, que vêm sendo feitas desde a década de 40, revelam mais de 1.100 anos de construções ininterruptas, muitas vezes sobrepondo um monumento ao outro.

Embora agosto esteja dentro do período de chuvas é uma boa época para conhecer a região pois o calor não é tão intenso e se pode suportar bem as caminhadas de 8 a 10 quilômetros por dia como indicam os roteiros e as subidas nas principais pirâmides ou templo de onde se tem uma vista deslumbrante.

O ideal é contratar um roteiro pela Internet ou a partir da capital. Ele inclui a passagem aérea de ida e volta, hospedagem, translado, guia e alimentação (almoço no trajeto das trilhas e café da manhã) durante dois dias a um preço aproximado de US$ 450 a 500, dependendo do hotel escolhido.

Se possível leia antes um pouco da história e se familiarize com o Guia Oficial do Parque (US$ 20) para acompanhar o roteiro com mais facilidade.

O Parque é administrado pelo Instituto de Antropologia e História da Guatemala, responsável pela organização das trilhas que conduzem aos monumentos mais importantes.

O Museu guarda uma coleção robusta dos principais achados que revelam que os maias não usavam metal, apenas instrumentos de pedra lascada e polida e pedras preciosas como o jade, característico desta região.

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