Cecy Oliveira – editora da Aguaonline
Todos os acontecimentos trágicos deveriam ser aproveitados como lições. Seja na vida de cada de um nós, seja nas questões que afetam o nosso dia-a-dia. Sejam aquelas que fazem a diferença entre o governante que pensa na próxima geração ou aquele, medíocre, que só tem olhos para a próxima eleição.
Pois na tragédia do Sinos a busca de um vilão ou culpado parecia significar que uma vez encontrado o Judas o problema estava resolvido. A imprensa se comportou com o mesmo rito de sempre: a revelação do nome das empresas autuadas importava muito mais do que buscar a verdadeira dimensão da tragédia, as causas subjacentes, os fatores concorrentes para que o impacto do(s) despejo(s) irregulares tivesse alcançado as proporções de tragédia.
Chegou-se ao cúmulo de quase exigir dos técnicos da Fepam uma sentença condenatória sem apelação. A explicação inicial sobre as condições da Bacia, o detalhamento sobre a ação para tentar identificar o mecanismo que provocou a mortandade foram considerados pelos jornalistas presentes à reunião do Comitesinos como “enrolação”.
Foi uma pena mesmo que não tivessem aproveitado melhor a lição e se qualificassem um pouco mais no entendimento do que é mesmo essa tal de “gestão das águas”.
As empresas são culpadas por despejos fora do padrão? É claro que são e merecem ser punidas naquilo que dói mais: os seus lucros, o seu marketing, o seu nome. Que aprendam a lição que a maioria das grandes empresas do mundo já aprendeu: poluir está cada vez mais fora da moda!
Mas e as prefeituras que deveriam ter preocupação com o saneamento? Qual a culpa delas? Total e completa. Devem ser cobradas sim. Se concederam os serviços de água e esgoto que cobrem da concessionária. Isto é assunto delas, sim. Ou a tal titularidade municipal tão defendida não vale nesta hora?
Os políticos de todos o segmentos e matizes têm culpa? Desde vereadores a deputados, prefeitos, governadores, todos têm culpa pelo desastre. Alguém aí viu se falar em saneamento e recursos hídricos nestes debates eleitorais?
O poder judiciário em todas as suas instâncias também têm sua parcela? É claro que sim. Já vi muitos juristas dizendo que não se pode usar recursos da saúde em saneamento. Meu Deus! Este é o verdadeiro investimento em saúde na medida em que evita a doença. Os demais, todos, são investimentos em doença!
Mas ainda há um outro expediente que começa a tomar corpo no Estado com a complacência de alguns setores do Judiciário: as indenizações milionárias por causa do mau cheiro exalado pelas estações de tratamento de esgoto. Já há precedentes em Rio Grande e Passo Fundo. Se essas ações prosperarem será uma tragédia tão grave quanto a do Sinos. E então como ficamos? Se não tem tratamento de esgoto, reclama-se. Se tem tratamento reclama-se do mau cheiro.
É evidente que deve ser cobrada eficiência nos projetos de Estações de Tratamento de Esgoto (ETEs). Hoje a tecnologia já permite que se construam sistemas que utilizem alternativas como encapsulamento ou o uso de floculantes orgânicos que reduzem significativamente o odor gerado durante o tratamento. Exija-se então do prestador de serviço que adote a tecnologia mais adequada mas obrigá-lo a pagar indenização não vai eliminar o mau cheiro e nem melhorar a situação do saneamento no Rio Grande do Sul. Ao contrário. Só vai tornar mais aguda a crise.
Opinião do leitor II
Nome: Massao Okazaki
Comentário: Considero que as ETEs não devem exalar mau cheiro e para tal devemos reformular por completo o seu tratamento. O fechamento de portos de areia pode ter sido uma das causas da mortandade de peixes. A prova disso é que com o uso de apenas uma draga conseguiu-se melhorar a quallidade da água. A atividade minerária pode liberar os finos tão necessários, por ex., para os fungos e diatomáceas. Ao contrário do que se afirma a turbidez (amarelo)decorrente da atividade minerária da extração de areia, além de acrescentar oxigênio, permite a entrada de luz solar para a ocorência da fotossintese.
E a comunidade?
É para a população que também se dirige o dedo acusador.
Ela tem culpa sim.
E não é pequena.
Pelo lixo que lança nas ruas, nos arroios. Pelo uso perdulário que faz das águas e do próprio rio.
Pela recusa em fazer a ligação de sua casa à rede cloacal para não ter que pagar a conta pelo esgoto que é retirado .
Ela é culpada quando faz ligações clandestinas, quando frauda os hidrômetros, quando ocupa irregularmente as margens dos rios.
Quando desmata, assorea, desvia água irregularmente para irrigar sua plantação. Quando retira areia em local proibido ou em demasia.
Porque antes de ser industrial, empresário, agricultor, areieiro, pescador essas pessoas são – ou deveriam ser -cidadãos.
Entender que a cada direito corresponde um dever é uma lição difícil de aprender neste Brasil de hoje.
Oxalá essa dor de agora nos ensine alguma coisa. Nem que seja apreender a gemer.
Opinião do leitor
Nome: Vilson Trava Dutra Filho
Mensagem: Se a sociedade e a mídia não entenderem as “verdades” contidas no editorial escrito por Cecy Oliveira, estaremos mais distante da recuperação do Rio dos Sinos. Parabéns!
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