Irresponsabilidade ambiental

Eugenio Singer

O último Relatório de Sustentabilidade de Cambridge, publicado em agosto de 2006, apresenta os resultados dos Diálogos Sustentáveis realizados entre 2003 e 2006, com mais de 400 especialistas em sustentabilidade de cinco paises: Áustria, Quênia, África do Sul, Reino Unido e Estados Unidos.

Segundo o relatório, “a meta ou o propósito fundamental de uma Boa Economia é melhorar, de forma constante, o bem-estar de todos, agora e no futuro, com o devido cuidado à eqüidade, dentro das limitações da natureza e através do ativo engajamento de todos os participantes”.

Muito bem, até aqui nada de novo. Milhares de definições desta natureza têm sido realizadas desde o primeiro milênio, Aristóteles que o diga!

Segundo o mesmo relatório, as principais falhas da Economia Atual são: a falta de Educação; a falta de Governança; o foco no curto prazo; a injusta distribuição de poder, riqueza e bem-estar; a fraqueza humana; os incentivos impróprios como o comércio não sustentável ou injusto; os custos de externalidades, desconsiderando valores sociais e ambientais; a falta de consenso coletivo sobre o propósito de longo prazo ou metas para uma Boa Economia; valores incompatíveis com a sustentabilidade e métricas erradas.

O Relatório de Sustentabilidade de Cambridge indica ainda que a Boa Economia deva ser: inclusiva, focando no compartilhamento e benefícios globais; de longo alcance focando nas conseqüências e gerações futuras; desenvolvimentista e com melhoria contínua; eqüitativa na justa distribuição; sustentável; participativa; inovadora; diversificada; acessível no tangente à oferta de oportunidades e atenta ao bem-estar e qualidade de vida das pessoas;

Todas as definições e métricas aplicadas ou resultantes destes diálogos parecem não conseguir romper a barreira tão desejável da sustentabilidade que a cada ano se torna mais virtual.

Toda vez que avaliamos os resultados de algo que propomos e não conseguimos alcançar, estabelecemos novos indicadores, novas metas, novos paradigmas. No mundo empresarial dizemos que rodamos o PDCA e por meio de uma análise crítica estabelecemos as novas metas. A questão é que quando existe o consenso para a definição dos novos patamares, ou quando o avanço orgânico do desenvolvimento é tímido, a “coisa” vai mesmo é patinar!

Um dos índices mais intrigantes que vi recentemente foi o Índice de Felicidade do Planeta (HPI). O HPI é uma métrica inovadora que mostra a eficiência ecológica com a qual o bem-estar humano é entregue. O conceito é básico, três macroindicadores: satisfação, expectativa de vida e pegadas ecológicas. O HPI é a relação entre estas três variáveis:

Satisfação de Vida X Expectativa de Vida

HPI = ___________________________________

Pegada Ecológica

Os resultados podem surpreender, pois o paradigma ortodoxo de desenvolvimento econômico é abstrato no índice. O HPI procura mostrar as relações entre os fundamentais recursos planetários, a forma como são transformados e entregues para a sociedade, em termos da sua satisfação e expectativa de vida.

O incrível é que o resultado desta análise é completamente contra intuitiva, face aos vieses do mundo capitalista. O mais incrível ainda é descobrir que as ILHAS são as que apresentam melhores equilíbrios e escores para o HPI. Mesmo assim nenhuma nação possui um equilíbrio perfeito para os três macroindicadores.

Alguns dos resultados mais interessantes além do exemplificado acima são:

1) é possível viver mais e mais satisfeito com impactos ambientais muito menores;

2) paises com a mesma pegada ecológica podem gerar expectativa e satisfação de vida muito diferentes;

3) paises similares em outros termos, podem gerar satisfação de vida muito diferente.

De acordo com o HPI, os paises mais “Felizes” são a Colômbia, Panamá, Santa Lúcia, São Vicente e Granadinas e Vanuatu. Já no bloco inferior encontram-se Latvia, Lituânia e Rússia.

Estas são conclusões interessantes que nos remetem a uma reflexão profunda para pensarmos no país que queremos, ou que metas são realmente alcançáveis e importantes para nossa sociedade. O fato é que as agendas recentes têm se perdido nas últimas décadas e o que temos encontrado mesmo são verdadeiras irresponsabilidades sócio-ambientais.

Mesmo assim, o solo é fértil, os recursos ainda são abundantes e, apesar da baixa estima, podemos virar este jogo. Sejamos felizes, mas conscientes com nosso consumo e pegadas ecológicas!

Como é o Índice

O “índice planeta feliz” foi construído a partir de três indicadores:

– Esperança de vida (os autores recorreram sobretudo a dados das Nações Unidas);

– Percepção por parte dos cidadãos de “satisfação com a vida” (a partir de sondagens internacionais como a World Values Survey, onde se pede às pessoas para, numa escala de 0 a 10, dizerem onde se situam relativamente à satisfação com a sua vida em geral);

– “Pegada ecológica” – conceito que exprime a área produtiva equivalente de terra e mar necessária para produzir os recursos utilizados e para assimilar os resíduos gerados por uma dada unidade de população.

Veja no arquivo abaixo o ranking dos países:

O que é pegada ecológica?

Veja matéria publicada sobre este assunto na Aguaonline 106 e a lista de 36 países e suas respectivas pegadas ecológicas.

Aguaonline 106.

O caso do Brasil

O Brasil apresenta uma desvantagem intrínseca inicial muito grande. Por maior que seja nossa expectativa de vida individual e nossa satisfação, as pegadas ecológicas são tão ruins, que já começamos com um enorme deságio no HPI.

Ocupando uma posição intermediária, o Brasil apresenta um HPI de 48.6 para uma expectativa de vida de 70.5 anos, uma satisfação de 6.3 e uma pegada ecológica de 2.2.

O inusitado é que quando os intelectuais brasileiros definiram o Brasil que gostaríamos ser, no Fórum do DNA Brasil, em outubro de 2004, verificamos que estávamos a 55% do país ideal, no caso a Espanha, em termo das oito dimensões e 24 indicadores definidos no Índice DNA Brasil. No HPI, se compararmos a nossa posição relativa com a Espanha, verificamos que estamos 10% a sua frente, pois a Espanha possui um HPI de 43%.

Autor

Eugenio Singer é empresário e ambientalista. Sócio Fundador da ERM Brasil e do Instituto Pharos, organizações que dirige, é Membro do Comitê Idealizador do Instituto DNA Brasil e tem participado em vários Fóruns Nacionais, entre eles o de Diálogos Sustentáveis da Embaixada Britânica e o de Cidadania Empresarial da FIEMG.

Publicou recentemente o livro “Governança Costeira: O Brasil Voltado para o Mar”.

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